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Chama o Max: (De)feito para você?

05 fev 2021, 18:58 - atualizado em 05 fev 2021, 18:58
“Um dos vilões do Itaú foi a taxa média praticada nos empréstimos”, diz Max Bohm, da Empiricus

Há quase vinte anos, minha rotina é a mesma. A temporada de resultados é sinônimo de acordar mais cedo e dormir mais tarde.

Nesta semana, a temporada de resultados do 4T20 começou para valer com os números dos grandes bancos brasileiros. Sempre eles, os primeiros a abrir seus resultados trimestrais.

Como se fosse algo orquestrado, há anos Santander Brasil inaugura os resultados trimestrais dos bancos, seguido de Bradesco e Itaú. Banco do Brasil vem sempre, pelo menos, uma semana depois dos três.

Desta vez foi diferente. Que estranho! Itaú foi o primeiro a divulgar. Será algum sinal?

Brincadeiras à parte, imagino que o Itaú tenha antecipado sua divulgação para coincidir com a passagem de bastão para o novo CEO, Milton Maluhy Filho, que começou a comandar o banco oficialmente nesta terça-feira (2).

Sendo bem direto ao ponto, depois de anos cobrindo bancos, recomendando Itaú na maior parte do tempo, confesso que é a primeira vez que me decepcionei com os números apresentados.

Quando comparamos com o desempenho operacional de seus concorrentes diretos (Santander e Bradesco), a decepção se agrava.

O que será que está acontecendo com o Itauzão? Crise de identidade? Necessidade de mudança?

Nada melhor do que analisar os números para melhor entender o que está acontecendo.

Vamos começar pela margem financeira bruta, o top line dos resultados dos bancos. Essa linha é composta pela carteira de crédito multiplicada pelos spreads bancários (diferença entre os juros que o banco te paga para captar os recursos e os juros que esse mesmo banco cobra para te emprestar dinheiro), além da receita com tesouraria.

Enquanto o Itaú mostrou queda de 6% na margem financeira em 2020 contra 2019, o Santander registrou aumento de 6,6% e o Bradesco crescimento de 7,4%. Diferença enorme, não é?

Um dos vilões do Itaú foi a taxa média praticada nos empréstimos (mais baixa), que causou uma redução significativa nos spreads. Por que a retração nos spreads do Itaú foi tão severa? Precificaram mal as operações de crédito?

O outro detrator da margem financeira foi a receita com tesouraria. Santander e Bradesco mostraram forte crescimento anual nas operações da mesa proprietária (trading e gestão de ativos e passivos). Já o Itaú registrou queda de 10% nessa linha. O que houve com a mesa de operações do Itaú BBA? Ela, que sempre foi referência no mercado financeiro, desta vez fraquejou.

Vamos olhar agora a protagonista de 2020: as despesas com provisão para devedores duvidosos (PDD). Face aos desafios financeiros impostos pela pandemia e um aumento provável na inadimplência, os bancos no mundo todo reforçaram suas provisões para devedores duvidosos, o que trouxe grande impacto no lucro líquido das instituições ao longo do ano.

Pois bem. Sem surpresas, Itaú, Bradesco e Santander aumentaram suas despesas com PDD. Mas atente para as proporções. Santander cresceu suas provisões em 3,8% no ano; Bradesco mostrou aumento de 30%, e o Itaú registrou uma despesa com devedores duvidosos 52% maior.

Algumas perguntas ficam no ar: será que o modelo de provisionamento por perda esperada do Itaú não estava superdimensionado? Excesso de conservadorismo? Será que não havia espaço para reverter de maneira mais contundente as provisões no 4T20, tendo em vista um cenário econômico com um pouco mais de visibilidade? Consequência: lucro do Itaú foi para o ralo.

Outra distorção marcante entre os grandes privados brasileiros: foi o índice de eficiência operacional. Este indicador mede o total das despesas operacionais sobre as receitas com serviços e seguros. Quanto menor este indicador, mais eficiente é o banco.

Enquanto o Santander reduziu em 4 pontos percentuais o seu índice e o Bradesco em 2 ponto percentuais, o Itaú elevou o indicador em 5 pontos percentuais, ficando menos eficiente em 2020. Será que o Santander e o Bradesco fecharam mais agências e ajustaram o seu pessoal de maneira mais assertiva? Será que a competição com as fintechs está “machucando” mais o Itaú do que os demais bancos?

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“O ano de 2020 foi desafiador para todos os bancos brasileiros, mas me parece que houve um erro grotesco de estratégia no maior banco privado do país”, afirma o colunista (Imagem: Reuters/Sergio Moraes)

O resultado desses movimentos controversos do Itaú foi uma rentabilidade pífia de 14,5%, muito pouco para um banco em que nos últimos anos manteve seu patamar de rentabilidade (medida pelo ROE) acima dos 20%. Para efeito de comparação, o Santander manteve sua rentabilidade próximo dos 19% e o Bradesco, perto dos 15%, tendo já encerrado o 4T20 com um ROE de 20%, mostrando ótima evolução.

Como curiosidade, foi a primeira vez que o lucro trimestral do Bradesco superou o do Itaú desde que este se fundiu com o Unibanco (2008). Certamente, uma marca animadora para o Bradesco, e vergonhosa para o Itaú.

O fato é que o ano de 2020 foi desafiador para todos os bancos brasileiros, mas me parece que houve um erro grotesco de estratégia no maior banco privado do país. Vimos uma evolução operacional admirável por parte de Santander e Bradesco ao longo do ano. Já o Itaú pareceu perder o foco nos últimos trimestres e teve um 2020 para riscar da sua história.

Desculpas para isso não faltam: transição de comando, mudanças em várias diretorias, excesso de cautela, perfil diferenciado da carteira de crédito, entre outros.

Será que o banco “Feito para você” virou “Defeito para você”? Espero que não. Mas uma luz amarela acendeu.

Vamos deixar o novo CEO do banco trabalhar. O Itaú tem crédito com os investidores e tem meu voto de confiança.

A fênix laranja precisa ressurgir em 2021.

Grande abraço,

Max Bohm.

Equity Research, CNPI, CGA
Graduado em Ciências Econômicas pela UFRJ e pós-graduado em finanças pela FGV-RJ, Max Bohm acumulou experiência como analista e gestor de ações em grandes instituições como Valia e Grupo Icatu Seguros. Atualmente, é sócio da Empiricus, responsável pelas séries Microcap Alert e As Melhores Ações da Bolsa.
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Graduado em Ciências Econômicas pela UFRJ e pós-graduado em finanças pela FGV-RJ, Max Bohm acumulou experiência como analista e gestor de ações em grandes instituições como Valia e Grupo Icatu Seguros. Atualmente, é sócio da Empiricus, responsável pelas séries Microcap Alert e As Melhores Ações da Bolsa.
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