Amazônia

Desmatamento em áreas com tribos isoladas cresceu 113% em 2019, aponta relatório

03 mar 2020, 11:55 - atualizado em 03 mar 2020, 11:55
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Segundo a Funai, o Brasil tem hoje 28 povos isolados comprovados(Imagem: Reuters/Ricardo Moraes)

O desmatamento em terras que concentram índios isolados no país aumentou 113% entre julho de 2018 e julho de 2019, segundo relatório preparado pelo Instituto Socioambiental (ISA) com base em dados do Prodes, o sistema nacional de satélites que monitora a perda de vegetação nativa.

O relatório, que será apresentado pelo ISA nesta terça-feira à Comissão de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) em Genebra, mostra que o ataque aos territórios com registros de tribos isolados é ainda maior do que nas terras indígenas demarcadas, em que chegou a 80% no mesmo período.

De acordo com dados da Fundação Nacional do Índio (Funai), o Brasil tem hoje 28 povos isolados comprovados, que são acompanhados a distância, e indícios de outros 86.

O desmatamento nas áreas indígenas representa apenas 4,2% do total da perda de floresta na Amazônia (Imagem: Arquivo/Agência Brasil)

Desde o final da década de 1980, a política indigenista brasileira é de não fazer contato com essas populações, que vivem em sua maioria em algum tipo de território protegido, seja de terras indígenas demarcadas ou unidades de conservação federais e estaduais.

Os dados compilados pelo ISA apontam que o desmatamento aumentou em 37 terras indígenas, sete unidades de conservação federais e em 54 terras indígenas e cinco unidades de conservação estaduais onde há registros de índios isolados.

Apenas no período finalizado em julho de 2019, segundo o ISA, foram desmatados 21 mil hectares, um aumento de 113% em relação ao período anterior.

“Quando analisamos os últimos 12 anos (2008 a 2019), as Terras Indígenas apresentaram uma forte retomada do desmatamento a partir de 2017, superando em 34% os altos índices registrados em 2008. O desmatamento nas TIs da Amazônia já consumiu mais de 1 milhão de hectares”, diz o documento do ISA.

O desmatamento nas áreas indígenas representa apenas 4,2% do total da perda de floresta na Amazônia, mas o levantamento mostra um aumento acentuado no último ano, vindo já de um crescimento considerável entre 2017 e 2018.

Os dados do Prodes permitem a análise do desmatamento em áreas protegidas —reservas indígenas e unidades de conservação— apenas desde 2008. Os dados deste ano são os maiores desse período.

O levantamento mostra que seis terras indígenas na Amazônia que concentram indícios de tribos isoladas estão entre os 13 territórios que respondem por 90% do desmatamento (Imagem: Reuters/Ueslei Marcelino)

De acordo com o estudo, a grilagem de terras, o garimpo ilegal e o roubo de madeira praticados por invasores seguem como os principais vetores do desmatamento nessas áreas, além da abertura de novas áreas para obras de infraestrutura.

O levantamento mostra ainda que seis terras indígenas na Amazônia que concentram indícios de tribos isoladas estão entre os 13 territórios que respondem por 90% do desmatamento da Amazônia em 2019.

“O panorama para os povos indígenas isolados no Brasil, portanto, é devastador. Com a explosão do desmatamento e da destruição das florestas e o avanço de práticas ilícitas, como o garimpo, extração ilegal de madeira e grilagem de terras, a existência desses grupos está gravemente ameaçada”, aponta o ISA.

“Possíveis massacres”

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O atual governo vem ignorando as denúncias de iminência de possíveis massacres de povos indígenas, especialmente dos isolados (Imagem: Reuters/Ricardo Moraes)

O relatório apresentado à ONU aponta a redução drástica de orçamento nos órgãos de proteção ao meio ambiente, como Ibama e ICMBio, como principal motor desse avanço do desmatamento no país, que chega até os indígenas, associado ao desmonte da estrutura da Funai, que perdeu a capacidade de proteger os indígenas e avançar na demarcação de terras.

“O atual governo vem ignorando as denúncias de iminência de possíveis massacres de povos indígenas, especialmente dos isolados. Drásticos cortes de orçamento inviabilizam os trabalhos do Estado na promoção e defesa dos direitos dos povos indígenas e podem levar a cenários ainda mais graves do que os já constatados nos últimos anos”, diz o texto.

Uma das mudanças na Funai apontada é a recente nomeação do ex-missionário Ricardo Lopes Dias, ligado à Missão Novas Tribos do Brasil, na Coordenação-Geral de Índios Isolados e de Recente Contato da Funai. Dias é diretamente responsável pela tentativa de contato da MNTB com índios isolados.

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A indicação de um missionário para chefiar a CGIIRC aponta para o retorno de uma política de contato forçado (Imagem: Reuters/Ricardo Moraes)

A organização evangélica de origem norte-americana coloca como sua missão evangelizar indígenas e tem em seu histórico dezenas de ações entre os zoé, os waiãpi, os ianomami e os povos do Vale do Javari, tendo sido retirada de terras indígenas por diversas vezes.

Como mostrou a Reuters, uma ação do Ministério Público Federal que tenta retirar Dias do cargo apresentou um áudio em que Edward M. Luz, filho do presidente da organização missionária, afirma que Dias foi colocado no cargo para “formalmente mudar essa política” de manter os indígenas isolados.

“A indicação de um missionário para chefiar a CGIIRC aponta para o retorno de uma política de contato forçado que, quando vigorou no país como política de Estado, nos anos 1970, provocou a morte de milhares de índios por doenças e violência perpetradas pelos próprios agentes de órgãos públicos”, diz o relatório.

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