Coluna do Carlos Lopes

Juros altos: Por quanto tempo iremos conviver com eles, afinal?

06 abr 2022, 12:44 - atualizado em 06 abr 2022, 12:44
Federal Reserve Juros altos inflação Fed Banco Central EUA
Sob pressão: Federal Reserve lidera guinada global em direção à alta dos juros para combater inflação (Imagem: REUTERS/Kevin Lamarque)

Dois anos após o início da pandemia, os economistas ainda discutem se os efeitos inflacionários da atual crise de fato são temporários ou se de algum modo indicam que houve uma mudança permanente nas condições econômicas. O que não era uma tarefa fácil, tornou-se ainda mais complicada em função da guerra na Ucrânia.

Por isso, a disparada da inflação pelo mundo tem exigido reações rápidas em tempos incertos e começa a dar sinais de que pode ter efeitos ainda mais duradouros.

Antes da pandemia, o mundo vinha de um longo período de juros baixos. As economias avançadas mostravam dificuldade em elevar a inflação para suas respectivas metas e a crise parecia reforçar essa tendência.

Por esse motivo, em meados de 2020, o Banco Central americano indicou que poderia ser mais leniente com a inflação por algum tempo, na tentativa de convencer consumidores e empresas de que os juros continuariam muito baixos por muito tempo. A estratégia não durou muito. No início do ano seguinte a inflação começou a disparar muito acima do planejado.

“Nos últimos 25 anos, tivemos a combinação perfeita de forças desinflacionarias, como a demografia, globalização e tecnologia”, disse Jerome Powell, presidente do BC americano no final de março. Alguns desses fatores podem persistir, eventualmente trazendo o mundo de volta ao equilíbrio anterior, mas ao menos por mais alguns anos, a alta nos preços de energia e outras pressões inflacionárias devem acabar se sobrepondo.

A guerra e a pandemia terão implicações permanentes sobre o funcionamento da economia global, com consequências para o comportamento dos preços nos próximos anos.

Os impactos sobre a cadeia de suprimentos provocados pela epidemia de Covid têm feito os países repensar a forma de organizar sua logística e produção, levando em consideração a segurança no fornecimento desses suprimentos em momentos como esse.

Globalização, mercado de trabalho e energia

Um indicador do Fed de Nova York mostra que essas limitações na oferta global atingiram seu pior momento no final do ano passado e melhoraram pouco desde então. Se antes o objetivo era conseguir reduzir custos ao máximo, agora a busca por uma oferta mais confiável pode levar a um aumento de preços.

Carlos Lopes, economista do banco BV
“Ainda deve levar algum tempo para que os efeitos das grandes mudanças vividas pelo mundo recentemente sejam completamente superados”, afirma Carlos Lopes, do BV (Imagem: Divulgação/ BV)

Essa globalização da economia mundial é também afetada pela guerra na Ucrânia. A importante mudança vista no quadro geopolítico mundial já tem mudado a atuação de governos e multinacionais. Empresas e países buscam rapidamente reduzir sua dependência econômica de algumas economias.

A Europa, por exemplo, tem acelerado a transição energética para fontes renováveis e considerado a geração nuclear. Esse movimento também deve se refletir em preços mais elevados.

As mudanças dos últimos anos também são vistas no mercado de trabalho. Nos EUA, a taxa de vagas de emprego abertas é de 1.8 por pessoa desempregada, sugerindo um mercado de trabalho muito aquecido. Enquanto isso, o número de pessoas empregadas ainda não atingiu o patamar pré-crise e a quantidade de desempregados é maior. Ou seja, empresas têm tido dificuldade em encontrar os perfis que precisam, o que se reflete em pressão sobre salários.

E os juros no Brasil?

E no Brasil a história não foi diferente. Uma série de reformas e medidas econômicas que vinham sendo adotadas desde 2016 reforçavam a percepção do mercado e do Banco Central de que a economia viveria estruturalmente com juros mais baixos. O início da pandemia e a expectativa de forte retração na economia aumentaram a confiança de que o país não veria novamente a taxa básica em dois dígitos.

Pouco tempo foi necessário para se notar o contrário. O que começou com pressões pontuais em alimentos, combustíveis e energia, logo se mostrou uma inflação disseminada e persistente. O indicador estourou o teto da meta em 2021, irá superar também em 2022 e corre o risco de repetir a dose em 2023. Alguns preços de reajustes menos frequentes, como salários e serviços públicos, passaram a incorporar reajustes maiores, ajudando a carregar a inflação à frente.

Ao final de 2019, a pesquisa Focus do BC, que coleta as expectativas dos economistas sobre indicadores econômicos, mostrava que a mediana das projeções acreditava que, após três anos, a taxa real de juros teria caído para 3,0%. Essa mesma medida, hoje, indica uma taxa real maior, de 4,0%, embora ainda abaixo do patamar do final de 2016, de 5,25%.

Ainda não está claro se os juros altos voltarão a ser a normalidade nos próximos 25 anos, mas ainda deve levar algum tempo para que os efeitos das grandes mudanças vividas pelo mundo recentemente sejam completamente superados. Por aqui, as já tradicionais tensões eleitorais e a sempre presente possibilidade de retrocessos na economia devem dificultar ainda mais a volta ao antigo normal.

Carlos Lopes é economista no banco BV desde 2013 e já passou por instituições financeiras como Itaú BBA, Banco Fibra e WestLB. É formado pela Universidade de São Paulo e tem mestrado no Insper.

Carlos Lopes é economista no banco BV desde 2013 e já passou por instituições financeiras como Itaú BBA, Banco Fibra e WestLB. É formado pela Universidade de São Paulo e tem mestrado no Insper.
Carlos Lopes é economista no banco BV desde 2013 e já passou por instituições financeiras como Itaú BBA, Banco Fibra e WestLB. É formado pela Universidade de São Paulo e tem mestrado no Insper.
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