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O caso das Americanas (AMER3) e a função da recuperação judicial

07 fev 2023, 13:53 - atualizado em 07 fev 2023, 13:53
Americanas
Caso Americanas deve ser considerado um divisor de águas no mercado de capitais brasileiro, mas ainda existem muitas dúvidas sobre extensão e consequência (Imagem: Bloomberg)

Por Guilherme Bier Barcelos*

O caso das Americanas (AMER3) será objeto de estudo e de comentários por muitos anos. E, quem sabe, um divisor de águas para o mercado de capitais brasileiro, à semelhança do caso Enron para os Estados Unidos. A despeito dos rumores, pouco se sabe sobre os fatos, tampouco a extensão de suas consequências.

De qualquer modo, até agora se pode afirmar que: (i) o ex-CEO da companhia, Sergio Rial, que assumiu a gestão nos primeiros dias de janeiro, renunciou uma semana depois, afirmando ter encontrado indícios de inconsistências contábeis estimadas em R$ 20 bilhões; (ii) tal notícia provocou uma corrida dos bancos para executar as garantias contratualmente previstas; e (iii) uma reação das Americanas, que foi a propositura de uma recuperação judicial.

Americanas e o Direito

Dito isso, pode-se afirmar que se está diante de um dos casos mais interessantes que permitirá analisar a interface entre o direito societário e o direito da empresa em crise. Isso porque o risco é inerente ao mercado e às atividades empresariais.

Portanto, o ordenamento jurídico necessita de um procedimento próprio para tanto. Ao mesmo tempo, o direito societário e o mercado de capitais contemplam diversos mecanismos para fins de assegurar melhor e maior governança das sociedades.

Isso vale, sobretudo, àquelas que possuem capital aberto, como é o caso das Americanas. E, para tornar o assunto ainda mais interessante, os atuais controladores da companhia são empresários bem-sucedidos.

Essa razão, ao menos em termos abstratos, dariam condições aos bilionários acionistas de arcar com os valores necessários para “eliminar as inconsistências”.

O caso e a função: e agora?

Em face desse contexto, a pergunta que se apresenta é a seguinte: considerando-se que há indícios da existência de condutas culposas e/ou dolosas por parte dos antigos gestores da companhia, seria possível a Americanas se valer da recuperação judicial, pois a crise não teria origem no risco do negócio?

Além disso, como os bancos que emprestaram recursos à Americanas, em sua grande maioria, celebraram negócios jurídicos com garantia fiduciária, a execução dessas garantias deveria ser sobrestada até a assembleia-geral de credores ou não?

Ou seja, o assunto não é singelo. Ao que parece, a chave de resposta é pensar na própria devedora.

Logo, acredita-se que a recuperação judicial é o único mecanismo capaz de salvar as Americanas neste momento. Assim, a persistirem as execuções movidas pelas instituições financeiras, a empresa, que é centenária, não sobreviverá.

Isso, contudo, não impede, tampouco inviabiliza, que os responsáveis pelos ilícitos sejam investigados. Se for o caso, processados e julgados.

Pode-se até cogitar na responsabilização do acionista controlador, caso se prove a culpa e/ou o dolo. Porém, o que não é possível é confundir as Americanas com seus controladores e seus gestores.

Há poucos anos, na Operação Lava Jato, já houve esse tipo de confusão. E o resultado foi desastroso.

Portanto, a questão central é que a eventual recuperação das Americanas não seja equiparada ao ganho dos gestores.

*Sócio-diretor do RMMG Advogados, head da área Societária

Sócio do RMMG Advogados
Guilherme Bier Barcelos é sócio do RMMG Advogados, onde é o head da área societária. Graduado e Mestre em Direito pela UFRGS, é Doutorando em Direito Comercial na Universidade de São Paulo (USP). Foi pesquisador visitante junto ao Max Planck Institute for Comparative and International Private Law, em Hamburgo (Alemanha) no ano de 2018.
Guilherme Bier Barcelos é sócio do RMMG Advogados, onde é o head da área societária. Graduado e Mestre em Direito pela UFRGS, é Doutorando em Direito Comercial na Universidade de São Paulo (USP). Foi pesquisador visitante junto ao Max Planck Institute for Comparative and International Private Law, em Hamburgo (Alemanha) no ano de 2018.
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