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O que é preciso para construir uma DAO?

08 out 2022, 16:00 - atualizado em 10 out 2022, 19:06
DAO descentralização
Crypto Times conversou com Cintia Ferreira, fundadora da EVE NFT – DAO focada em empoderar mulheres na Web3 – e com Rodrigo Portaro, fundador da Echoa (Imagem: Freepik/rawpixel.com)

Uma das novas ondas no mercado cripto é a formação de organizações autônomas descentralizadas, ou DAOs na sigla em inglês. Essas organizações são grupos, com fins econômicos ou sociais, que se organizam por meio da estrutura descentralizada do blockchain.

Em muitas DAOs, o poder de voto sobre uma decisão é relacionada diretamente à quantidade de tokens da DAO que o votante possui, como um token, um voto.

Entretanto, muitos criticam que esse formato não é diferente de uma empresa que possui acionistas, onde a centralização vem em forma de poder monetário.

Recentemente, Vitalik Buterin, fundador da Ethereum (ETH), publicou um estudo que fez em seu blog acerca do assunto, onde diz que, em sua opinião, as DAOs precisam ter uma camada descentralizada acima delas, mas é necessário uma organização mais centralizada nos níveis abaixo delas.

Para ele, grande parte das DAOS cometem esse erro ao colocar o poder de decisão do grupo na quantidade de tokens que possuem.

“Os DAOs típicos tendem a ‘descentralizar’, reunindo grandes quantidades de capital em um único pool e usando a votação do detentor do token para financiar cada alocação”.

Buterin usa como exemplo de DAO que é descentralizada em uma estrutura acima da centralizada o UkraineDAO, que arrecada fundos para os que foram prejudicados pela guerra na Ucrânia.

“O UkraineDAO, por outro lado, funciona dividindo suas funções em vários pods – fundos de doações  – , onde cada pod funciona da forma mais independente possível.”

Nesta DAO, uma camada superior de governança pode criar novos fundos de arrecadação, mas, uma vez que um pod é feito e financiado, ele funciona em grande parte de maneira centralizada.

“Internamente, os pods individuais têm líderes e funcionam de maneira mais centralizada, embora ainda tentem respeitar um ethos de autonomia pessoal.”

Decisões côncavas e convexas

Em sua publicação, Buterin discute sobre as diferentes formas de tomar uma decisão. A tomada de decisão dentro de uma DAO pode ser o que diferencia ela das outras, ou mesmo de uma empresa tradicional.

Para Vitalik, uma maneira de categorizar as decisões que precisam ser tomadas é verificar se elas são convexas ou côncavas.

“Em uma escolha entre A e B, primeiro olharíamos não para a questão de A vs. B em si, mas sim para uma questão de ordem superior: você prefere fazer um compromisso entre A e B ou jogar uma moeda?

O criador da Ethereum ainda busca expressar essa distinção usando um gráfico:

DAO
(Imagem: Vitalik Buterin’s website/DAOs are not corporations)

Buterin conclui dizendo que, quando as decisões são convexas, a descentralização do processo de tomada de decisão pode facilmente levar à confusão e a compromissos de baixa qualidade.

Por outro lado, quando as decisões são côncavas, confiar na sabedoria das multidões poderia dar respostas melhores.

Como criar uma DAO?

O Crypto Times conversou com a Cintia Ferreira, fundadora da EVE NFT – DAO focada em empoderar as mulheres na Web3 – e com Rodrigo Portaro, fundador da Echoa – comunidade para criadores na Web3 – e co-fundador da Alma DAO – DAO com o propósito de acelerar a adoção de soluções e democratização da Web3.

A conversa girou em torno de buscar compreender o que é preciso, na prática, para construir uma Organização Autônoma Descentralizada do zero. Confira:

CT – Como é o processo de construir uma DAO?

Cintia Ferreira – Primeiro, temos que estabelecer quais são os objetivos e valores da DAO. Eles são importantes para termos um mesmo propósito pelo qual se reunir. Depois, temos que encontrar pessoas com essas mesmas dores e desejos para expandir a comunidade.

Nesse processo de crescimento, será necessário estabelecer regras sobre as quais a DAO vai operar.

Como serão feitas as tomadas de decisões? As divisões de tarefas, votos e recompensas? Como será a oferta dos tokens? Ou seja, criar os parâmetros de governança.

Uma vez decididos quais serão os objetivos, estrutura e tokens, já podemos trabalhar de forma descentralizada e transparente pelo propósito da DAO.

Rodrigo Portaro – Tenho bastante convicção de que tudo começa com a definição de uma missão maior que envolve crenças e valores bem claros, poderosos e humanos.

Na Echoa, estamos ajudando artistas a viverem de sua arte, e temos princípios e valores muito bem definidos que martelamos em todos os nossos eventos.

O processo começa nesta definição porque é a base de tudo. Uma vez que definimos essas crenças e valores, a gente cria uma história e vai para o mercado.

Como a gente traz os primeiros membros? Os cem primeiros membros importam muito, porque precisam ser pessoas ultra alinhadas nestas crenças e valores e na missão. Porque esse grupo será o criador e defensor da cultura da nossa DAO.

À medida que vamos trazendo estes cem primeiros, vamos delegando papéis e responsabilidades em torno de pequenas missões. Uma vez que temos estes cem primeiros, a gente abre para novos membros, e estes primeiros vão ter a responsabilidade de fazer o que fizemos com ele.

CT – Quanto custa criar uma DAO? Quais são os custos necessários?

Cintia Ferreira – Essa resposta vai variar muito para cada caso. Há um custo tecnológico referente à criação de contratos na blockchain, que são bem acessíveis e variam de acordo com a rede utilizada, se Ethereum ou Solana, por exemplo.

O custo regulatório é o mais oneroso e vai depender muito do local onde a DAO for criada. Cada jurisdição tem regras próprias e os valores variam muito. Atualmente, no Brasil, não tem legislação sobre DAOs.

Rodrigo Portaro – Aqui temos um custo mensal bem baixo, muitos fazem no amor, e porque realmente acredita na missão dos valores, e hoje nosso custo mensal é mais ou menos RS$ 1.500 até RS$ 2.000. Esse é o custo básico de tecnologia, estagiário e produção de alguns conteúdos.

CT – O que é necessário para construir uma DAO?

Cintia Ferreira – O elemento fundamental para se construir uma DAO é, sem sombra de dúvida, a comunidade. Todo o espírito de descentralização, colaboração e horizontalidade são construídos com a força da participação da comunidade. Todos os demais elementos tecnológicos e regulatórios existem para viabilizar e potencializar essa participação coletiva.

Rodrigo Portaro – Fora as crenças e valores que já comentei, eu vejo quatro pilares: 

Onboarding, como é o processo das pessoas entrarem dentro da comunidade, e o que a gente fala neste evento de onboarding, como introduzimos nosso universo para estas pessoas.

Segundo pilar é a coordenação: como vamos coordenar as pessoas em torno das missões. Temos ferramentas de comunicação como Discord ou Whatsapp, ferramentas de documentação e traqueio de contribuição em blockchain.

O terceiro pilar é de compensação. Como compensamos  as pessoas que estão se doando? Pode ser dinheiro, mas também pode ser exposição do trabalho, conexão com alguém valioso, é bem amplo.

O quarto pilar é governança. Quais são as regras que mantém essa comunidade trabalhando de maneira justa?

CT- Qual o sistema de votação de sua DAO?

Cintia Ferreira – Cada token tem direito a um voto. Se alguém tem mais do que um token, pode votar proporcionalmente. Por essa razão, na venda do Mint Pass, o token que dá direito à votação na EVE, limitamos a três mint passes por carteira.

Rodrigo Portaro – O sistema de votação da minha DAO ainda não está completo, mas fizemos pequenas tomadas de decisões mais importantes por snapshot. Hoje, temos pessoas envolvidas em projetos importantes, e temos um sistema de badges [selos], ou seja, quem tem o selo de embaixador para cima tem poder de voto nas propostas.

CT – Quais são os benefícios gerais de formar uma DAO, e quais são os benefícios oferecidos pela sua?

Cintia Ferreira – Um dos maiores benefícios que podemos destacar é o envolvimento da comunidade e a troca de experiência entre os membros.

Quando temos um grupo grande de pessoas altamente engajadas e interessadas em contribuir e se esforçar por um objetivo comum, os resultados são incríveis.

E a EVE está crescendo impulsionada por essa comunidade incrível e aliados que querem aprender mais sobre tecnologia, cultura, empreendedorismo e mercado financeiro, se conectar com lideranças e fortalecer laços de colaboração e, sobretudo, criar uma Web 3.0 mais diversa e representativa.

Rodrigo Portaro – Os benefícios gerais, acredito que seja estar em companhia de pessoas que acreditem no que você acredita em prol de uma missão em comum.

Então, acho que esse é o maior benefício, pertencer e ser reconhecido pelo que está fazendo. Saber que você está fazendo parte de algo que é maior do que você mesmo, acho impagável. Acredito que oferecemos um pouco disso na nossa [DAO].

Sendo mais tangível, outro benefício é entrar em projetos que nós aceleramos. Somos uma DAO de artistas e criadores, nós encontramos bons projetos e trazemos business para ele.

CT – Em sua opinião, o que falta na construção de DAOs para maior amadurecimento desse sistema?

Cintia Ferreira – Uma regulamentação mais atualizada com essas novas modalidades de organização, que reflita principalmente as inovações nos métodos de governança.

Rodrigo Portaro – Com certeza, lidar com projetos complexos através de descentralização progressiva.

Já estou convicto de que, para projetos hiper complexos como o nosso, ou como criar filmes, bandas de animação e jogos – processos que envolvem muita gente, dinheiro e tempo -, não é possível começar de forma descentralizada.

É preciso de liderança, de pessoas que vão realizar as primeiras coisas e remunerar elas de forma justa. Após já estar construído, ir abrindo para fãs e investidores ou para outros criadores, coisas como poder de decisão ou propriedade intelectual. Alguma coisa precisa nascer primeiro, de maneira centralizada, para depois descentralizar com o tempo.

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Repórter do Crypto Times
Jornalista formado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Repórter do Crypto Times, e autor do livro "2020: O Ano que Não Aconteceu". Escreve sobre criptoativos, tokenização, Web3 e blockchain, além de matérias na editoria de tecnologia, como inteligência artificial, Real Digital e temas semelhantes. Já cobriu eventos como Consensus, LabitConf, Criptorama e Satsconference.
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