Política

Tributação de grandes empresas digitais enfrenta polêmicas sobre constitucionalidade

11 dez 2020, 19:28 - atualizado em 11 dez 2020, 19:28
João Maia
O deputado João Maia lembra que a subtributação das grandes empresas digitais provoca perdas fiscais de US$ 100 bilhões por ano entre os países da OCDE (Imagem: Luis Macedo/Câmara dos Deputados)

Paralelamente à reforma tributária (PECs 45/19 e 110/19), a Câmara analisa propostas de tributação de grandes empresas de tecnologia. Uma delas (PLP 218/20) cria a Contribuição Social sobre Serviços Digitais (CSSD), com alíquota de 3% sobre a receita bruta e destinação dos recursos arrecadados para programas federais de renda básica. Outra proposta (PL 2358/20) institui a chamada CIDE-Digital, Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, com alíquotas progressivas e destino da arrecadação para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).

O deputado João Maia (PL-RN), autor da ideia da Cide-Digital, afirma que o alvo são as gigantes estrangeiras do setor digital, com receita global superior a R$ 3 bilhões e receita bruta no Brasil superior a R$ 100 milhões.

“A CIDE-digital não onera os consumidores e equilibra a competição de mercados com outros setores – tais como os de radiodifusão, som e imagem, telecomunicações e tecnologia da informação – que são competidores submetidos a uma pesada carga tributária pela legislação brasileira e geram muito mais empregos e impostos no Brasil do que as empresas globais de internet”, disse.

O deputado lembra que vários países europeus também buscam corrigir a atual subtributação das grandes empresas digitais, que provoca perdas fiscais de US$ 100 bilhões por ano, segundo dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Críticas à proposta

No entanto, alguns tributaristas e advogados questionam essas propostas. Em recente matéria no jornal Valor Econômico, um escritório de advocacia apontou bitributação e inconstitucionalidade na proposta de Contribuição Social sobre Serviços Digitais, sobretudo por incidir sobre fato gerador já tributado por PIS/COFINS.

A advogada tributária Gisele Bossa, conselheira do Conselho de Administração de Recursos Fiscais (CARF), aponta riscos de a tributação digital prejudicar o Brasil nas transações comerciais internacionais.

“Acho que uma tributação digital à brasileira realmente vai ter o condão de comprometer investimentos estrangeiros e a real inserção do Brasil na cadeia global de valor. A gente já é um país eminentemente importador de tecnologia”, disse.

Gisele Bossa lembrou que a polêmica tributação digital feita por países europeus, como França e Espanha, já levou a ameaças de retaliação dos Estados Unidos, discutidas no âmbito da Organização Mundial do Comércio.

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Gisele Bossa lembrou que a polêmica tributação digital feita por países europeus, como França e Espanha (Imagem: Agência Brasil/ Marcello Casal Jr.)

“Diferente do contexto europeu, onde essas propostas de tributação foram criadas, essas empresas de tecnologia não estão lá sediadas. Já no Brasil, essas gigantes – por fatores de ordem regulatória ou econômica – já estão aqui sediadas. E, como se isso não bastasse, quando a gente olha as remessas realizadas por pessoas jurídicas, os valores já estão sujeitos a uma alta carga tributária: retenção na fonte de 15%, além de ISS ou ICMS, a depender da operação”, explicou Gisele.

Receitas não declaradas

Mas o deputado João Maia, autor da proposta de CIDE-Digital, rebate as críticas.

“Não cabe nenhum questionamento quanto à constitucionalidade e à legalidade. Trata-se de uma proposta de tributo para compensar as ações de planejamento tributário que deslocam receitas e lucros das operações realizadas no Brasil para outros países com menor tributação. Portanto, não há sentido em se falar em dupla tributação, pois essas receitas e lucros não são declarados no Brasil”, observou.

O vice-presidente da Comissão Especial da Reforma Tributária, deputado Sidney Leite (PSD-AM), admite a necessidade de maior debate antes da votação do tema pela Câmara.

“Eu sou favorável que a gente tenha primeiro uma legislação sobre a questão da internet. Também sou favorável que se tribute tanto a comercialização de produtos quanto a prestação de serviços. Afinal, isso é algo que veio para ficar e a pandemia acelerou a utilização dessa ferramenta. Porém, entendo que não dá para a gente votar de forma açodada”, disse.

Nos debates da reforma tributária, a tendência é de substituição de vários tributos pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), com incidência, inclusive, sobre os serviços digitais. Mas há emendas de parlamentares que também sugerem tributação digital específica.

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