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“Blockchain não vai mudar nada, não vai ser a tecnologia”; plataforma DeSci quer “mudar o mundo”

05 set 2022, 17:40 - atualizado em 05 set 2022, 18:03
ViralCure blockchain descentralizado
(Imagem: Freepik/rawpixel.com)

Neste sábado (3), aconteceu o ViralCure Festival em Piracicaba, na antiga Usina açucareira de Monte Alegre. O evento foi promovido pela Sthorm, uma empresa DeSci (Decentralized Science), que tem o objetivo de ser um ecossistema voltado à descentralização da ciência por meio de blockchain e Web3.

O ecossistema da Sthorm é composto por várias iniciativas como o ViralCure, Artbit, Goodnoise, Theos, Mabloc, Planetary X, Cry.me, Rebelx e Paradox1.

A proposta dos fundadores da Sthorm, Pablo Lobo e Mariano Boris, é promover uma colaboração descentralizada entre pesquisadores pelo mundo através de uma “Open Science”, uma referência à ferramentas open sources.

O evento marcou o lançamento da plataforma ViralCure, a plataforma na Web3 para alcançar essa colaboração entre cientistas e colaboradores.

Matt Sorum, ex-baterista do Guns N’Roses participa da iniciativa com sua marca “Good Noise” e estava presente na celebração, onde realizou um show exclusivo ao lado de Gilby Clarke (Ex-Guns N’ Roses e Slash’s Snakepit), Billy Gibbons (ZZ Top) e Sebastian Bach (Skid Row).

No evento, diversos painéis discutirem sobre  papel do blockchain na ciência, e contaram com grandes nomes como Bob Richards, fundador da Singularity University, International Space University, SEDS, Space Generation Foundation e Odyssey Moon.

Richards trabalhou ao lado de Carl Sagan e se tornou um evangelista do movimento “NewSpace”, um catalisador para vários negócios espaciais.

Prof. Dr. Esper Kallás, titular do Departamento de Moléstias Infecciosas e Parasitárias da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), David Watkins, professor de patologia na Universidade George Washington e Michael Ricciardi, Diretor Associado de Pesquisa Translacional na mesma universidade. 

No painel do “novo capitalismo”, o evento contou com a presença de Marcelo Bechara, Diretor de Relações Governamentais da Globo, Alex Nascimento, Professor de Blockchain & STOs na universidade americana UCLA e Gilberto Fischel, CEO da MundusDAO.

A plataforma da ViralCure já conta com um marketplace de NFTs para arrecadação de fundos e artistas de grande porte estão entre as obras leiloadas.

Estes artistas também compareceram ao evento, entre eles a artista e fundadora da Eve.nft, Livia Elektra, Rodrigo Loli, ambos da Casa NFT e Thiago Gomes, Head de Marketing da Sthorm.

Ciência para todos

Pablo Lobo conta que com 10 anos, seu filho, Theo, teve uma doença grave chamada encefalite herpética. Trata-se de uma infecção no cérebro causada pelo vírus herpes simples.

Conforme conta em entrevista para o UOL, ele tinha um ano e oito meses de idade e começou a perder o controle motor. Foi submetido a um tratamento no cérebro para controle da infecção, perdeu 86% do lobo temporal direito, sofreu sequelas e teve que reaprender a falar e a andar.

Ficou sete meses internado em hospitais. Nesse período, conheceu Esper Kallás, médico infectologista e um dos principais responsáveis pelo enfrentamento da doença no Hospital das Clínicas, que cuidou de Theo.

“Ficamos muito amigos, tanto que, quando meu filho teve alta, Esper devolveu todos os cheques de pagamento num envelope. Nunca os depositou porque viu as dificuldades que eu enfrentei para bancar o tratamento caríssimo”, diz.

Foi assim que, no início de março do ano passado, quando os casos de covid-19 começaram a se espalhar pelo Brasil, Esper ligou para Lobo.

“Ele me perguntou: ‘Pablo, você tem como pedir doações para o HC? Somos a base da saúde pública do país e, sem ajuda, vamos colapsar’. Eu respondi: ‘Cara, vamos criar uma plataforma de doação direta para o hospital’.”

Foi quando surgiu a campanha #HCCOMVIDA, que, por meio da plataforma ViralCure, arrecadou mais de R$ 31 milhões para abertura de novos leitos, contratação de profissionais de saúde, compra de respiradores, ambulâncias e equipamentos de proteção individual, além de financiar pesquisas na luta contra a covid-19.

Em outra oportunidade, durante a pandemia, a ViralCure auxiliou a Mabloc, uma startup independente de biotecnologia, liderada por cientistas brasileiros e norte-americanos, a arrecadar mais de R$ 65 milhões para desenvolver tratamentos pioneiros e acessíveis que podem evitar futuras endemias e pandemias.

O Crypto Times, em conjunto com o Cointelegraph, conversou com Mariano Boris, um dos fundadores da empresa Sthorm, e sócio de Pablo Lobo, para entender mais sobre a proposta do projeto:

Crypto Times – Como surgiu a ideia do ViralCure?

Em 2017, fomos para Davos no fórum econômico mundial, na Suíça, onde juntam-se toda a galera poderosa e milionária. Fomos convidados para falarmos sobre esse projeto no Global Blockchain Digital Council (GBDC).

Foi meio estranho falar sobre descentralização e democratização em um lugar com tanta concentração de poder e capital. Era algo que não tinha tanto sentido.

Para falar a verdade, sempre nos sentimos incomodados com a cultura cripto, que sempre fala de um token que vai para a lua e deixar todos ricos. Isso é besteira.

Nós viemos de um outro background. Muito dos anos 90, com Mark Fischer e Nic Land, com o aceleracionismo e essa ideia de que a tecnologia tem uma capacidade verdadeira de mudança social.

Então, nós levantamos uma bandeira em Davos de que o blockchain não bastava. Blockchain não vai mudar nada, não vai ser a tecnologia.

Todos falam sobre o “hype” do blockchain, mas acredito que é porque não investiram tempo suficiente para estudar que é apenas uma tecnologia de transparência e rastreabilidade, nada mais que isso.

A pergunta é: como vamos usar essa tecnologia para uma mudança social e de governança verdadeira? Fomos com essa mensagem, um pouco de conscientização social dentro do mundo do blockchain.

Fora do mundo do blockchain podemos brigar com todos sobre centralização, e disrupção, mas dentro do mundo blockchain brigamos também com toda essa galera “Cryptobro”.

A primeira ideia do ViralCure é encontrar um caso de uso real em uma tecnologia que possibilita acesso descentralizado à participação de governança e propriedade de coisas como patentes, ou participação de financiamento científico.

Queremos que tenha sentido, hoje em dia todos colocam token para qualquer coisa. Não sei se tudo precisa de blockchain todo o dia. Acredito que deveríamos ser mais conscientes sobre como podemos usar essa tecnologia.

Já faz mais de 15 anos que trabalho com Pablo, e mais de 10 anos que estamos financiando uma empresa de Biotech, a Mabloc, e mais de 5 anos que esperamos o melhor momento para lançar [o token da DAO].

No meio do inverno cripto, é muito melhor mover um projeto adiante. Afasta as pessoas que vão comprar um token só por achar que vai valorizar. Não é esse o objetivo final. O objetivo vai ser compartilhar governança e o acesso a financiamento à ciência.

Humildemente acredito que é isso que pode ser o ponto mais forte em todo esse ecossistema que não é só o ViralCure, mas muitos outros projetos dentro da Shtorm.

Cointelegraph – Existem outros projetos que pensam dessa maneira?

Há um ano atrás, o conceito de DeSci não existia. Atualmente, basta pesquisar um pouco na internet e você vai ver que DeSci é uma das “hashtags” que mais tem atividade. Existem alguns projetos em Berlim e Estados Unidos. Está começando a surgir.

Acredito que a maioria dos iniciantes nesse mercado tem um pouco mais dessa ideologia para si. Antes não era algo tão “vamos ficar ricos”, nós acreditávamos de verdade que haveria uma mudança na forma de governança e acumulação de poder e capital.

A coisa mudou muito, mas acredito que vai voltar ao que era antes, muitos dos quem eu falo no mercado já possuem essa ideologia, e essa mudança vai fazer com que mais pessoas vejam esse sentido.

Vejo muita gente dentro de cripto e blockchain que não tem essa mentalidade, que não acredita que comprar uma fotinha de um macaco entediado seja tão legal assim e está esperando para ver se essa tecnologia vai ter algo de verdade para oferecer à sociedade.

A minha hipótese é que, se você entende cripto como uma revolução financeira, você está entendendo errado.

Quando você lê o primeiro whitepaper, escrito por Satoshi Nakamoto, é possível observar uma sobreposição de um ativo financeiro e de governança ao mesmo tempo.

O Século 21 vai nos mostrar que a governança e o dinheiro tem mais relação do que acreditamos. Quem vocês acham que governa o Brasil? O presidente, os milionários? Tem muitos poderes por trás

Temos a ilusão de que estamos escolhendo [na democracia] mas não estamos. Quem escolhe se um medicamento vai adiante, e receber financiamento, não é a população que vai se beneficiar disso. É a “mão invisível do mercado.”

Tem muita gente em cripto que acha que o mercado vai regular tudo, e não vai regular nunca. Vai acabar na mão de quatro loucos por aí.

Crypto Times – como será feito a governança na plataforma do ViralCure?

Na plataforma estamos tentando implementar algo que poucos projetos colocam esforçam que é fugir da governança típica de cripto. Afinal, como é feita a governança típica em cripto? Um token, um voto.

A pessoa que tem um milhão de tokens, tem um milhão de votos. Isso é a mesma m..que queremos fugir. A governança descentralizada acaba ficando centralizada, porque está na mão de quem tem poder monetário. Não faz sentido.

Estamos tentando experimentar o “Quadratic voting” e até NFTs como forma de governança. Pode ser que alguém que participa muito, e é ativo na comunidade, tem um NFT em que seu voto é x20. Pode ser que seja um NFT representando um cientista da plataforma.

Eu acho uma ideia muito infantil a de que se a governança em cripto é descentralizada, todos podem opinar sobre tudo. Uma coisa tão delicada como ciência.

Assim como acredito que o mercado não deveria ser um fator de decisão, a ciência não deveria ser tão socializada democraticamente a ponto de todos poderem opinar se eu posso operar a sua filha ou não.

É necessário ter opiniões mais qualificadas. Eu acho que o mundo cripto precisa evoluir em uma governança um pouco mais sofisticada, e entender que não deve ser algo simples como dividir todas as decisões, mas buscar saber quais devem ser descentralizadas e porque.

Crypto Times – quem é o público-alvo da ViralCure?

Vou problematizar um pouco essa pergunta. Nós fizemos um trabalho muito legal na pandemia com o Hospital das Clínicas em São Paulo. Arrecadamos bastante dinheiro para o Hospital, não ficamos com nada.

Mas eu tenho uma crítica em relação a isso. De todo esse dinheiro que juntamos, 85% foi doado por cinco pessoas.

É muito legal juntar todo esse dinheiro, mas se a visão verdadeira é fazer uma ferramenta de crowdfunding para que a sociedade empoderada financeiramente tome decisões de o que financiar e o que não financiar, então não tivemos êxito.

Deixando claro, foi uma forma de ajuda sim. Mas não é nosso objetivo final na plataforma. Acredito que o objetivo final na plataforma não é financiar a ciência, acho que é uma mudança de atitude ideológica em compreender que 90% da população tem o mesmo poder monetário que 10%.

Esse é o objetivo final mesmo da plataforma. A mudança na atitude da sociedade em entender que pode usar essa ferramenta para se empoderar e não depender da concentração de capital.

A plataforma terá momentos, para ser sincero acho muito provável que na primeira fase da plataforma, as pessoas que virão serão as que têm mais dinheiro. Muita gente quer, de verdade, mas não tem dinheiro, tempo ou conhecimento.

Seria muito hipócrita dizer que é uma ferramenta que foi construída agora para toda a sociedade. Vão ser fases, temos que manter a visão certa e não perdê-la.

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Repórter do Crypto Times
Jornalista formado pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Repórter do Crypto Times, e autor do livro "2020: O Ano que Não Aconteceu". Escreve sobre criptoativos, tokenização, Web3 e blockchain, além de matérias na editoria de tecnologia, como inteligência artificial, Real Digital e temas semelhantes. Já cobriu eventos como Consensus, LabitConf, Criptorama e Satsconference.
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