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Chama o Max: Euforia com disciplina

31 jul 2020, 11:09 - atualizado em 31 jul 2020, 11:09
“Ao invés do preço das ações caírem quando uma empresa anuncia uma oferta, a ação está se valorizando”, diz o colunista

Pela tradução no dicionário, a palavra “overhang” quer dizer saliência, protuberância, algo que sobressai.

No mercado financeiro, o termo ganha uma conotação um pouco diferente. Quando falamos em “overhang” de alguma ação, estamos querendo dizer que há um excesso de liquidez proporcionado por distorções entre oferta e demanda.

Esse descompasso acontece com mais regularidade nas ofertas secundárias de ações, os chamados follow-ons, muito comuns nos últimos meses.

Em uma emissão de ações, a empresa listada aumenta a quantidade de ações no mercado de modo que o lado da oferta fique mais forte do que o lado da demanda. E sabemos bem que, quando há mais gente querendo vender do que comprar, há um efeito negativo no preço.

Nos meus últimos 15 anos de mercado, presenciei esse movimento nestes momentos: uma empresa anunciava que iria realizar uma emissão acionária e, assim, investidores vendiam ações desta companhia para poderem comprá-las mais baratas ao participarem da oferta.

Isso acontece porque o aumento da disponibilidade de ações no mercado acaba diluindo a participação dos atuais acionistas que optaram por não comprar ações nessa nova oferta. Como consequência, também se reduz o dividendo pago por ação, já que a quantidade de ações da empresa é elevada.

No entanto, de um ano para cá, temos visto um fenômeno interessante. Estamos o chamando de “overhang às avessas”. Ao invés do preço das ações caírem quando uma empresa anuncia uma oferta, a ação está se valorizando, indo contra as leis de oferta e demanda.

Você consegue imaginar por que isso vem acontecendo?

O mercado está de olho em crescimento. Então, se uma empresa anuncia uma oferta de ação, quer dizer que ela vai captar recursos financeiros para colocar em prática uma estratégia de expansão operacional que pode ser orgânica ou inorgânica (via aquisições).

Veja as últimas ofertas secundárias de 2020. Natura, Centauro, Cogna, Lojas Americanas, Via Varejo, BTG Pactual são alguns nomes de peso que realizaram seus follow-ons, totalizando mais de R$ 15 bilhões ofertados ao mercado. Não vimos quedas relevantes nas ações após o anúncio das ofertas. Sua grande maioria tinha um único objetivo: crescimento das operações.

O mercado está quente também com os IPOs de empresas visando aproveitar o momento para crescer. O Grupo Soma, dono das marcas Farm e Animale, levantou R$ 1,8 bilhão para adquirir novas marcas e incrementar a sua estrutura digital (a ação estreia hoje na Bolsa sob o ticker GSOM3).

A Ambipar, empresa de gestão ambiental, captou R$ 1 bilhão para ir em busca de companhias nos EUA, com o objetivo de ampliar sua presença em um mercado de grande potencial — suas ações dispararam no primeiro dia.

A Locaweb, uma das queridinhas do mercado atualmente, colocou no caixa mais de R$ 500 milhões para realizar mais M&As e crescer ainda mais no segmento de e-commerce, e também viu suas ações se valorizarem expressivamente nos últimos meses.

Investidores estão querendo ver o dinheiro em caixa nas empresas para ser bem aplicado em expansão das operações e, assim, compram as ações. O tão famoso overhang nas ofertas não tem se confirmado.

Ou seja, o mercado está ávido por novidades, mas estamos diante de uma realidade diferente do período do boom dos IPOs de 2006/07, quando todas as ofertas de ações que surgiam eram tomadas por um oba-oba no mercado. Investidores “bidavam” a qualquer preço, como se não houvesse amanhã.

Vejo hoje um mercado mais disciplinado. Eu diria que está havendo um fluxo mais diligente e inteligente, que tem gerado uma euforia mais comedida, o que é positivo para a sustentabilidade da Bolsa.

Está funcionando mais ou menos assim: eu topo investir nessa empresa, mas no preço que considero o valuation atrativo. Caso a empresa venda bem a sua história de crescimento, os investidores até podem topar pagar no topo dos intervalos de preços das ofertas, mas a maioria das ofertas tem saído mais próximo ao meio do intervalo de preço.

Outro ponto que gostaria de destacar é o maior número de ofertas primárias atualmente, quando acontece uma diluição dos atuais acionistas, que acabam decidindo não vender suas participações nesse primeiro momento. O próximo IPO da fila, da incorporadora You (YOUC3), tem esse perfil.

Está havendo um maior alinhamento de interesses entre controladores e acionistas minoritários. O pensamento dos fundadores da nova empresa listada é: “Vocês me dão o voto de confiança e eu coloco este caixa para crescer a companhia, e ficamos ricos lá na frente” — o minoritário com a valorização das ações, e o controlador vendendo sua participação a um preço bem maior, em uma oferta secundária mais à frente.

Vejo com bons olhos essa maior racionalidade entre os participantes do mercado. Tanto acionistas controladores e bancos coordenadores, quanto os investidores pessoas físicas e institucionais.

Temos ainda muito a evoluir como mercado financeiro. Mas já há sinais de mais maturidade no ar.

Que venham mais IPOs e follow-ons. O mercado de capitais brasileiro agradece imensamente.

 

Equity Research, CNPI, CGA
Graduado em Ciências Econômicas pela UFRJ e pós-graduado em finanças pela FGV-RJ, Max Bohm acumulou experiência como analista e gestor de ações em grandes instituições como Valia e Grupo Icatu Seguros. Atualmente, é sócio da Empiricus, responsável pelas séries Microcap Alert e As Melhores Ações da Bolsa.
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Graduado em Ciências Econômicas pela UFRJ e pós-graduado em finanças pela FGV-RJ, Max Bohm acumulou experiência como analista e gestor de ações em grandes instituições como Valia e Grupo Icatu Seguros. Atualmente, é sócio da Empiricus, responsável pelas séries Microcap Alert e As Melhores Ações da Bolsa.
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