Coluna da Tatiana Sendin

Devemos desistir, de vez, do RH ou ainda há esperança?

27 fev 2024, 19:02 - atualizado em 27 fev 2024, 19:02
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“O RH parece estar mais desconectado do que nunca das necessidades dos negócios e dos desejos das pessoas”, afirma Tatiana Sendin (Imagem: Pixabay/ kirill_makes_pics)

Apoiar os funcionários no cuidado com a saúde mental e atingir as metas de diversidade e inclusão não estão mais entre as prioridades de recursos humanos. Este ano, o RH vai se concentrar em fortalecer ou alterar a cultura organizacional.

Segundo a pesquisa “Desafios do RH”, realizada pela Think Work, apesar das importantes transformações no mundo do trabalho, a cultura se manteve como prioridade do RH pelo terceiro ano consecutivo. Surpreendentemente, apesar dos desastrosos indicadores ligados à diversidade e saúde mental, esses pontos caíram mais de 15 posições, de 2022 para 2024, na pesquisa.

O RH parece estar mais desconectado do que nunca das necessidades dos negócios e dos desejos das pessoas. Isso levanta a questão: deveríamos desistir do RH?

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Ram Charan já tinha sugerido, em 2014, que o RH deixasse de existir. Recentemente, ele esclareceu que foi mal interpretado na época – que o RH é, sim, importante. Embora eu esteja longe de ser Ram Charan, o resultado da pesquisa me fez refletir.

Um estudo da consultoria de outro guru do RH, Josh Bersin, indica que 68% dos profissionais de gestão de pessoas sentem que estão atrasados em meio às transformações operacionais e tecnológicas.

RH: Cobranças de todos os lados e mudanças drásticas

Nos últimos anos, o escopo do RH mudou drasticamente. Sua atuação vai muito além dos temas tradicionais, como desenvolvimento, recrutamento e seleção. O RH passou a ter de saber como acolher e incluir pessoas trans, entender o impacto do #metoo ou #blm no negócio e aprender sobre os impactos do aquecimento global nos trabalhadores – especialmente nos que atuam ao ar livre.

Análises da Think Work mostram que o RH é cobrado por usar tecnologia, entender como as mudanças sociais e climáticas podem afetar os negócios, e por inovar nas práticas de gestão de pessoas. No entanto, poucos têm tempo ou conhecimento para isso.

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Mais da metade das empresas não possuem ações para lidar com as atuais mudanças sociais e climáticas e 60% estão alheias ao impacto da tecnologia nos negócios. Entre os próprios RH, 70% atribuem nota 7 ou inferior à inovação em gestão de pessoas na empresa em que atuam.

No dia a dia, o RH está atolado cuidando de processos operacionais e resolvendo questões pouco estratégicas. Mesmo em grupos de alta liderança, é comum surgirem dúvidas ligadas, por exemplo, a como fazer o reembolso do carro, ou qual o melhor modelo para dividir o bônus.

Recentemente, questionamentos sobre a volta ao escritório – sobre como convencer os funcionários a aceitarem com bom humor a política de trabalhar 5 vezes por semana no escritório – têm ficado mais frequentes.

E aí surge o motivo de reflexão. Não deveria o RH estar preocupado com questões mais graves e de alto impacto? Sem uma equipe equilibrada emocionalmente, o local de onde ela trabalha pouco importa. Tratar de política de automóvel também vai ser algo fútil frente aos eventos climáticos extremos.

Quando perguntamos aos RHs quais os principais desafios esperados para 2024, 62% deles citaram a cultura organizacional – seja fortalecer (38%) ou alterar (24%) a cultura corporativa. O fortalecimento da cultura manteve-se na primeira posição na pesquisa “Desafios do RH”, da Think Work, pelo terceiro ano seguido.

Sem saber exatamente como tratar os problemas complexos do mundo moderno, a impressão é que o RH os agrupa sob o rótulo de “cultura organizacional” e é por isso que ano após ano o tema se mantém em ordem.

Talvez na cabeça do RH uma cultura corporativa forte poderia ajudar no problema de alta rotatividade, baixo engajamento e maior desconfiança dos trabalhadores. Mas ao reforçar a cultura, a empresa vai estar só enfatizando o que faz hoje – e que, em muitos casos, dão sinais de também estarem desconfiados dos funcionários, de quererem maior controle (inclusive colocando todo mundo debaixo do mesmo teto) e de buscarem melhor custo-benefício (um jeito bonito para dizer pagar pouco por quem trabalha bastante).

Em um cenário de maior conflito entre “nós x eles”, com mais empoderamento dos indivíduos, as empresas deveriam justamente buscar o oposto: fazer diferente, reinventar a forma como gerem as pessoas.

Falta de apoio das lideranças de empresas joga contra RH

Não dá para colocar todo o peso por essa desconexão com a realidade nas costas do RH. A falta de conscientização da liderança é apontada como a maior barreira para a área de recursos humanos resolver os problemas de gestão de pessoas, mais do que a limitação financeira. Para um quarto dos RHs ouvidos pela Think Work, falta muito apoio da direção.

Na prática, a área de gestão de pessoas está presa entre fazer o que acredita ser necessário, atender às requisições das pessoas e satisfazer as vontades dos líderes. No meio disso, o profissional RH ainda tem de resolver questões básicas, como desenvolver a liderança, adequar a política de remuneração às novas legislações e lidar com o problema de produtividade – que está em queda em todo o mundo.

O RH tem de equilibrar os interesses de seus “clientes”. Com isso, acaba arriscando a continuidade das práticas e perdendo a oportunidade de ter uma atuação mais estratégica. O resultado, infelizmente, é que perdem a oportunidade de fazer diferente, de deixar o seu legado nas organizações. E, sem apresentar resultados, logo são substituídos.

Mais da metade (55%) dos executivos que ocupam a principal cadeira do RH (os CHROs) têm menos de quatro anos de companhia, como indica uma outra pesquisa da Think Work, “Raio X do RH”. Dois terços dos que assumiram a posição vieram do mercado. Nove de cada dez líderes de RH que chegaram à organização promoveram mudanças nas políticas e práticas de gestão de pessoas – em 58% dos casos foram mudanças drásticas.

Pessoalmente, teimo em acreditar que ainda há esperança e que não devemos desistir do RH. Mas o RH precisa saber quais temas priorizar e qual o lado da força ele deve se alinhar agora. São tempos de mudança.

Tatiana Sendin é fundadora e CEO da Think Work. Jornalista especializada em negócios e recursos humanos, nos últimos 20 anos, tem escrito sobre carreira, mercado de trabalho, gestão de pessoas, empreendedorismo e tecnologia.
Tatiana Sendin é fundadora e CEO da Think Work. Jornalista especializada em negócios e recursos humanos, nos últimos 20 anos, tem escrito sobre carreira, mercado de trabalho, gestão de pessoas, empreendedorismo e tecnologia.
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