Ucrânia

A cobrança dos países ocidentais sobre Lula na Guerra da Ucrânia, após um ano de conflito

23 fev 2023, 17:41 - atualizado em 23 fev 2023, 17:52
Brasil
Brasil é cortejado por países da aliança ocidental para assumir uma posição mais hostil à Rússia (Imagem: REUTERS/Yevhenii Zavhorodnii)

Em visita à Casa Branca no início do mês, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi instado por Joe Biden a dar apoio político e militar à Ucrânia, ao que o presidente brasileiro negou. “Nós não queremos nos envolver nessa guerra”, reiterou o presidente.

Fora das linhas oficiais, a relutância de Lula desagrada membros do bloco ocidental, que esperam do Brasil um tom mais contundente contra a Rússia, atribuindo a Putin a responsabilidade do conflito que agora entra em seu segundo ano.

Em desacordo com o discurso ocidental, o presidente brasileiro busca criticar a invasão da Rússia, mas atribui culpa também à política de expansão da Otan em direção ao país euroasiático.

O descontentamento mais duro com o discurso do petista foi expressado pela subsecretária de assuntos políticos do Departamento de Estado Americano, Victoria Nuland, dias após a passagem de Lula por Washington.

A assessora de Biden pediu que o governo brasileiro calce os “sapatos da Ucrânia” e reflita sobre como seria se um vizinho maior que o Brasil o invadisse e começasse, então, a tomar territórios.

Segundo o portal Metrópoles, Hayashi Teiji, embaixador do Japão, também manifestou “preocupação” quanto à neutralidade do governo brasileiro na questão, imaginando que essa mesma postura seria adotada em caso de uma incursão militar chinesa na ilha de Taiwan; Tóquio enxerga nesse evento uma ameaça à sua influência na Ásia.

Apesar da crescente pressão sobre a diplomacia brasileira, Christopher Garman, diretor-executivo para as Américas da Eurasia, acha pouco provável que o Brasil ceda sua neutralidade para se juntar à posição do grupo EUA-União Europeia-Japão.

Na avaliação de Garman, “o governo está comprometido em uma agenda sul-sul, focando em um aprofundamento das relações com a China, que é o principal parceiro comercial do Brasil”.

“Além disso, o país precisa da Rússia para importar fertilizantes”, completa.

Garman minimiza qualquer chance de retaliação por parte dos americanos e europeus contra o Brasil, uma vez que estes agentes entendem, apesar dos protestos, que os interesses da Otan e do Brasil não são os mesmos.

Não alinhamento é política comum para emergentes

A falta de interesse do governo brasileiro em se engajar na guerra da Ucrânia também é compartilhada por Índia, China e África do Sul, três das cinco nações que, junto ao Brasil e à Rússia, compõem o BRICS e representam o conjunto de países emergentes do Sul Global. 

Brasil
Índia cedia G20 em 2023, sob pressão por condenação de ações de Putin

Assumindo a presidência rotativa do G20 este ano, a Índia já deixou claro que não pautará sanções econômicas contra a Rússia no encontro que ocorrerá em Nova Déli, mesmo que a guerra seja um assunto inescapável em razão de seus efeitos inflacionários sobre as cadeias globais de valor.

Poucos fazem tão bem o papel da ambiguidade estratégica na diplomacia quanto o primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, um provável ‘espelho’ para a atuação de Lula na questão russo-ucraniana.

O líder indiano enviou ajuda humanitária à Ucrânia, mas não virou às costas para Putin; corteja Washington e aliados ocidentais com equipamentos de defesa militar de alta tecnologia, e mantém compras em preços descontados de commodities, metais e fertilizantes vindos da Rússia.

“Esses países [emergentes] continuam querendo comercializar com a Rússia, mas rechaçam a imposição de sanções econômicas, evitando assumir custos econômicos por causa disso”, diz Garman, que complementa: “a tendência é que esses países vejam a guerra como uma questão mais regional do que um conflito entre democracia e autocracia”.

Brasil quer ‘clube da paz’ para negociar saída pacífica na Ucrânia

Aventada nos primeiros dias do governo, a proposta de um ‘clube da paz’ é a alternativa defendida pelo governo brasileiro para uma saída político-diplomática da guerra no Leste Europeu.

A ideia contemplaria a criação de um grupo de países intermediadores e não envolvidos no conflito que seria mais abrangente do que o Conselho de Segurança da ONU. O objetivo, então, seria trazer Rússia e Ucrânia à mesa de negociação.

O tema, segundo o próprio Lula, já havia sido introduzido aos europeus Olaf Scholz e Emmanual Macron, bem como a Biden. O governo russo, sob a figura do vice-chanceler Mikhail Galuzin constatou também ter recebido a proposta e disse que a  analisaria, medindo sua viabilidade em função dos desdobramentos do conflito militar.

Os obstáculos para o sucesso da proposta são óbvios. De um lado, os russos continuam enxergando o conflito como uma questão de sobrevivência nacional; do outro, países da Otan (a aliança militar que une os países do Atlântico Norte) permanecem convencidos de que a vitória de Putin esvaziaria as regras internacionais, impondo precedentes para a ação de outras nações adversárias da ordem ocidental, qual seja, a China.

Lula já se colocou como interlocutor de outros conflitos

Não é a primeira vez que o presidente Lula procura fazer a mediação de conflitos. Logo que assumiu pela primeira vez, em 2003, o petista fez a defesa da criação de um Estado palestino e a resolução de um conflito territorial envolvendo Israel e Síria.

A intervenção de Lula foi um fracasso, gerando mal-estar entre políticos israelenses e pouco engajamento de membros da comunidade internacional.

Em 2010, já com o elogio  ‘esse é o cara’ de Barack Obama, o petista obteve mais êxito. Junto à Turquia, o governo brasileiro conseguiu costurar o acordo nuclear que permitiu ao Irã enriquecer urânio fora do país com fins pacíficos.

À época, o papel do Brasil foi amplamente elogiado, dado grau de dificuldade e divergência entre os atores envolvidos.

Estagiário
Jorge Fofano é estudante de jornalismo pela Escola de Comunicações e Artes da USP. No Money Times, cobre os mercados acionários internacionais e de petróleo.
Jorge Fofano é estudante de jornalismo pela Escola de Comunicações e Artes da USP. No Money Times, cobre os mercados acionários internacionais e de petróleo.
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