Eleições 2022

Lollapalooza x Bolsonaro: Por que o TSE deve reverter a decisão sobre manifestações políticas no evento

28 mar 2022, 16:07 - atualizado em 28 mar 2022, 16:07
Bolsonaro
O PL, partido do presidente Jair Bolsonaro, alegou propaganda eleitoral antecipada em favor de Lula durante o evento Lollapalooza (Imagem: Shutterstock/BW Press)

No último sábado (26), o PL, partido do presidente Jair Bolsonaro entrou com uma representação junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no mínimo, inusitada.

O festival de música Lollapalooza, que acontecia ao longo do final de semana, entrou na mira da legenda por conta de uma apresentação de Pabllo Vittar.

O show da artista não virou foco de atenção do bolsonarismo pela sua performance, mas sim pelo apoio declarado que a cantora expressou ao ex-presidente Lula (PT) na corrida eleitoral de 2022.

Além de fazer o popular “L” com as mãos, Pabllo desfilou entre o público carregando uma toalha com o rosto do petista e encerrou seu show dizendo “Fora, Bolsonaro”.

Para o PL, as manifestações poderiam ser enquadradas como propaganda eleitoral antecipada.

Lula é hoje o principal entrave à reeleição de Bolsonaro.

Tudo indica que ambos se enfrentarão no segundo turno das eleições, e todas as pesquisas apontam hoje para a vitória do ex-presidente.

A resposta do TSE à demanda do PL também causou surpresa: em decisão monocrática, o ministro Raul Araújo proibiu a manifestações políticas no evento — que é privado — e fixou uma multa de R$ 50 mil para eventuais descumprimentos por parte dos artistas.

A medida despertou indignação entre os músicos, os fãs e, principalmente, os especialistas em direito eleitoral, que apontaram “censura prévia” por parte do tribunal.

O ministro Edson Fachin, presidente da Corte, decidiu levar o caso ao plenário com urgência. A liminar será então submetida ao colegiado do TSE  assim que o processo for liberado pelo relator. Isso, no entanto, ainda não tem data para ocorrer.

O magistrado já sinalizou discordância de Araújo, ao dizer que “o tribunal, por sua maioria, fixa a interpretação majoritária que, na matéria, tem sido de rechaço pleno e firme de qualquer forma de censura”.

Para Antonio Ribeiro Júnior, advogado e integrante da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP), a decisão deve ser revista pelo plenário, tanto com base na jurisprudência histórica como também com base na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5970, julgada neste ano pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que dispõe de forma clara sobre as diferenças entre showmício, show privado e o direito de liberdade de expressão exercida por artistas durante suas apresentações.

O jurista avalia que a decisão é controversa em diversos aspectos, e por isso causou tanta polêmica. “A decisão proíbe que artistas se manifestem sobre conteúdos político eleitorais durante a realização do Lollapalooza. A partir daí surge a ideia de que essa proibição é uma censura prévia, quando você não pode se manifestar sobre algo em relação de uma decisão judicial”.

“O segundo ponto é a questão da caracterização ou não de propaganda eleitoral antecipada. Se os artistas criticarem ou governo A ou B ou declararem apoio ao candidato C dou D vai se caracterizar como propaganda. No caso, a lei eleitoral trata que na propaganda antecipada há o pedido explícito de votos, o que não aconteceu neste caso”.

Ribeiro também aponta falhas na tese da realização do “showmício”, prática que é, de fato, vedada nas eleições. “O showmício acontece quando há a presença do candidato. Se não há a presença dele, se ele não contratou aquele show para fins eleitorais, não há como configurar o evento desta forma”.

Lollapalooza x Bolsonaro

A cantora Pabllo Vittar ergueu uma toalha com o rosto do ex-presidente Lula (PT) (Multishow/Reprodução)
A cantora Pabllo Vittar ergueu uma toalha com o rosto do ex-presidente Lula (PT) (Multishow/Reprodução)

A decisão do TSE não intimidou os artistas que se apresentaram no Lollapalooza, sobretudo os do line up de domingo (27), último dia de evento. As bandas seguiram entoando manifestações contrárias ao presidente.

Figuras conhecidas do público jovem, como é o caso do youtuber Felipe Neto e a cantora Anitta, se dispuseram, inclusive, a pagar as multas caso algum dos participantes fosse penalizado.

Ainda que entenda o incômodo do público com a decisão, o especialista acredita que não se deve incentivar o seu descumprimento, principalmente em ano eleitoral. Ribeiro acredita que o questionamento de decisões deve acontecer por meio da lei processual.

“Desacreditar a decisão das instituições coloca em risco não apenas a legitimidade mas também a segurança das eleições. Isso traz instabilidade, o que pode ser muito grave”.

Apesar de controversa, especialistas demonstraram preocupação com a postura de Araújo. Em nota, a OAB de São Paulo disse estar preocupada com “a confusão da livre expressão de opinião com propaganda eleitoral ostensiva e extemporânea”.

A entidade ainda destacou que “a liberdade de expressão, por meio da manifestação espontânea e gratuita de ideias, é essencial para assegurar a continuidade democrática e fomentar o debate público sobre eleições”.

“Silenciar a voz de cidadãos com multa em valor superior à pena no caso da ocorrência da conduta, pode tolher o exercício da cidadania, limitar a difusão de ideias e empobrecer a qualidade e variedade do debate público nas mais diversas arenas da sociedade civil”, diz a ordem em um trecho de sua nota.

A atuação do magistrado também foi posta em xeque: o mesmo ministro que acatou ao pedido do PL de Bolsonaro indeferiu uma solicitação do Partido dos Trabalhadores sobre outdoors de propaganda da campanha de Bolsonaro espalhados pela região Centro-Oeste do país, alguns pedindo votos explicitamente.

O #EleNão de Roger Waters

Esta não é a primeira vez em que a manifestação de algum artista incomoda o presidente da República. Há pouco mais de três anos, em outubro de 2018, o ex-líder da banda Pink Floyd, Roger Waters, se apresentava no Brasil.

Durante seu show no Allianz Parque, em São Paulo (SP), foi projetado no telão a expressão “Ele não”, que na ocasião havia se tornado símbolo de resistência à eleição de Bolsonaro.

Na época, o então candidato entrou com uma ação contra o cantor, pedindo a investigação do que seria uma “conduta criminosa” por parte de Waters. A campanha de Bolsonaro alegava que o cantor havia praticado abuso de poder econômico em favor da candidatura de Fernando Haddad (PT).

O pedido, no entanto, foi indeferido pelo TSE.

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Jornalista paulistana formada pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e editora do Money Times. Passou pelas redações da CNN Brasil e TV Globo como produtora, VOCÊ S/A e VOCÊ RH como repórter e Exame.com como redatora estagiária.
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