Economia

O que o Banco Central brasileiro tem a ensinar sobre combate à inflação

05 jul 2022, 15:52 - atualizado em 05 jul 2022, 15:52
Inflação
Analistas apostam que o pior da inflação já passou. (Imagem: Reuters/Pilar Olivares)

O Brasil foi um dos primeiros países a começar a revisar a sua política monetária quando a crise da pandemia ainda estava no seu auge. Quando a covid chegou ao país, a nossa taxa de juros estava em 3,75% ao ano. Em poucos meses, ela foi ao seu patamar mínimo – de 2% – e se manteve assim até maio de 2021.

Enquanto isso, o acumulado de 12 meses da inflação saltou de 3,30%, lá em março de 2020, para 8,60% em maio de 2021. Quatro meses depois, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ultrapassaria os dois dígitos e não sairia mais: em maio deste ano, a inflação chegou a 11,73%.

Sim, a inflação ainda está alta. Mas os analistas apostam que o pico da escalada de preços ficou para trás. Se eles estiverem corretos, foi em abril, quando o IPCA registrado foi de 12,13%.

E isso significa que o Banco Central do Brasil acertou na elevação da taxa de juros, que hoje está em 13,25%, ao contrário do Federal Reserve e do Banco Central Europeu (BCE), que ainda não encontraram a fórmula ideal para controlar a disparada dos preços.

Entenda o que o BC tem a ensinar (ou não) sobre combate à inflação:

Autonomia

Em fevereiro do ano passado, foi sancionada a lei que garante a autonomia do Banco Central. Isso, por si só, já é um ponto positivo para a economia.

Significa que o órgão tem liberdade para executar as políticas monetárias sem interferência do governo. Além disso, o presidente e diretores do BC possuem mandatos fixos de quatro anos que não coincidem com o do Presidente da República. Isso evita interferência política.

“Significa que o BC não está resolvendo o problema dos políticos e sim da sociedade. Sem a autonomia, poderia acontecer o que está acontecendo na Petrobras. Por exemplo, a elevação da taxa de juros faz com que o governo contraia uma dívida maior. E o Banco Central poderia se sentir pressionado a não baixar a inflação”, afirma Caio Mastrodomênico, analista econômico e CEO da Vallus Capital.

O Fed e o BCE também são autônomos, assim como a autoridade monetária do Japão, Reino Unido, Coreia do Sul, Turquia e alguns países latinos, como México, Chile, Colômbia e Peru.

Uma outra vantagem é que as reuniões do BC acontecem a cada 45 dias, o que permite um alinhamento muito preciso com o timing da economia. Alguns bancos centrais chegam a se reunir a cada bimestre ou trimestre.

A síndrome do gato escaldado

Quem tem mais de 35 anos se lembra bem do que é viver com hiperinflação. Entre as décadas de 80 e 90, os preços no Brasil dispararam mais de 2.000% – o dinheiro perdia valor de uma dia para o outro. Para conseguir colocar ordem na casa, o governo precisou fazer diversas reformas econômicas e mudanças de moeda até conseguir chegar ao Plano Real, em 1994.

“A gente tem esse histórico de hiperinflação no nosso passado recente. Então, a população sabe o quanto a inflação machuca”, destaca Yihao Lin, coordenador de economia da Genial.

Ele ainda lembra que, durante o governo de Dilma Rousseff, houve um movimento inflacionário que refrescou a memória do brasileiro. Na época, o acumulado da inflação chegou a 10,71% em janeiro de 2016 – a ex-presidente deixou o poder em agosto do mesmo ano, após um processo de impeachment.

A pandemia fez o fantasma da inflação voltar a rondar o país e a sensação piorou depois da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios, que abriu um espaço de R$ 106,1 bilhões no Orçamento de 2022. O susto de o governo furar o teto de gastos fez a autoridade econômica se mexer. “A situação fiscal era muito delicada. Então, o Banco Central iniciou o rápido aumento das taxas de juros”, afirma Yihao.

Países como os Estados Unidos e a Europa estavam há mais de 40 anos sem sofrer com a inflação. Então, eles apostaram que esse era um movimento transitório: quando chegou a pandemia, as nações desenvolvidas estavam preocupadas em estimular o consumo, garantir o pleno emprego e retomar a economia. Esse foi o plano de 2020. O ano seguinte foi focado nas cadeias de produção, que demoram mais para serem reconstruídas.

O que ninguém esperava era que 2022 começaria com uma guerra da Rússia contra a Ucrânia. O conflito aumentou a pressão no mercado de commodities, energia e alimentos – levando os planos de recuperação do hemisfério norte por água abaixo.

A demora na reação fez com que os Estados Unidos se vissem no meio da sua maior inflação nos últimos 40 anos – subiu para 8,6% em maio. Em junho, a inflação na zona do euro também chegou a 8,6%. Trata-se da mais alta da história.

A beleza dos emergentes

Além de ter agido mais rápido, o Banco Central brasileiro conta com uma vantagem: o tamanho da nossa economia. Sim, o Brasil é um país de tamanhos continentais e está entre as dez maiores economias do mundo, segundo os dados da Austin Rating – com um Produto Interno Bruto (PIB) de US$ 1,83 trilhão no 1º trimestre do ano.

Apesar disso, a economia brasileira está longe das líderes: os Estados Unidos possuem um PIB de US$ 25,45 trilhões e a China de US$ 19,91 trilhões. Conseguir promover mudanças na política monetária e fazer intervenções econômicas nesses países é muito mais difícil do que em países emergentes, por maior que eles sejam.

Por outro lado, Caio Mastrodomênico lembra que os países desenvolvidos têm reservas maiores que permitem que eles se arrisquem mais. “Os Estados Unidos criaram um pacote trilionário para conseguir se manter durante a pandemia. Eles têm um excesso de reserva que o Brasil não tem.”

Nem tudo são flores

O Banco Central brasileiro pode até ter sido mais rápido que os seus pares e já estar pensando em encerrar o ciclo de altas Mas Ricardo Rodil, líder do Mercado de Capitais e Sócio do Grupo Crowe Macro, lembra que o controle da inflação depende da disciplina fiscal do governo.

“Esse lado está comprometido. Além de todo o problema da economia mundial, nós estamos em ano eleitoral e com o governo tentando passar a PEC kamikaze que mostra que estamos em descontrole fiscal”, afirma. O cenário ainda não é estável o suficiente para dizer que a inflação alta ficou para trás.

Além disso, Bernardo Pascowitch, fundador do Yubb, destaca que o Banco Central brasileiro costuma tomar medidas muito agressivas. “Os juros sobem e caem muito rápido. Isso é um problema, porque parece que falta um certo planejamento do que vai ser feito.”

De fato, nos últimos 10 anos, a Selic já variou bastante. Em 2011, a taxa começou em um movimento de alta – na casa dos dois dígitos. Em 2013, foi para 7,25%; para o patamar dos 14% em 2016.

O período de maior estabilidade foi entre 2018 e 2019, quando a taxa se manteve em 6,50% por um ano e meio. De lá para cá, a Selic foi para a mínima de 2% e já chegou aos 13,25%. Em comparação, o BCE não reajusta a sua taxa de juros há 11 anos; e o Fed não reajustava desde 2018.

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Formada em Jornalismo pela PUC-SP, tem especialização em Jornalismo Internacional. Atua como editora-chefe no Money Times e já trabalhou nas redações do InfoMoney, Você S/A, Você RH, Olhar Digital e Editora Trip.
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