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Produtor de boi entrou descapitalizado em ano de maior oferta, exportações estáveis e consumo interno incerto

03 jan 2023, 9:57 - atualizado em 03 jan 2023, 9:57
Carnes, China
Importações chinesas de carne bovina podem se ressentir da covid e da economia mais lenta em 2023 (Imagem: China REUTERS/Tingshu Wang)

Por consenso das análises, o ano da pecuária de corte já está marcado por dois dos fundamentos mais importantes do setor que ficaram mais acentuados ao final de 2022. E que, na perspectiva mais conservadora, distribuirá desafios a toda a cadeia.

As exportações não vão andar muito nem em volume, nem em preços. Não darão prejuízo para os frigoríficos, porque, afinal, não se espera redução, mas as margens de lucros serão menores.

Para os produtores de boi, a sobra de animais se repetirá com maior intensidade sobre o ano passado, quando deu início à virada de ciclo da pecuária, com menor retenção de fêmeas. Haverá mais matéria-prima para abate.

Ressalta-se, por exemplo, que boa parte do boi que vai morrer este ano nasceu em 2021, quando criadores investiram em inseminação artificial em cerca de 26% das matrizes de corte, em destaque de Hyberville Neto, da HN Agro. Colabora para o excesso do plantel.

Mesmo sendo um animal chegando mais cedo ao mercado e com qualidade genética – o que é próprio do investimento em inseminação -, não terá garantias de boa remuneração, completa o consultor.

O terceiro fundamento da cadeia – e que a rigor é o principal por representar em torno de 70% dos abates de bovinos – ainda é incerto. O consumo interno, o maior desastre de 2022.

Thiago Bernardino de Carvalho, analista do Cepea, chama a atenção para um ponto que marcou os últimos 12 meses, mas que buscados em 2021 reproduz uma primeira incerteza para os próximos meses.

Inflação

A inflação do ano retrasado – 10,06%, pelo IPCA – foi carregada pelo consumidor nos meses seguintes, que “ajustou seus gastos”. Já no último semestre o custo de vida cedeu com o artificialismo da redução dos impostos sobre os combustíveis, conduzindo o acumulado desde janeiro a 6,47%.

A inflação deve ser contida nos dois primeiros meses, pelo menos, enquanto permanecer a desoneração da gasolina. A do diesel e biodiesel deverá durar o ano inteiro, de acordo com a primeira medida do presidente Lula. O Bolsa Brasil foi assegurado em R$ 600 e não se descarta novas transferências de renda.

Porém, como o mercado financeiro vai precificar esse desequilíbrio fiscal e qual será o comportamento do Banco Central independente, em relação aos juros, bem como o comportamento de defesa das empresas em relação à geração de empregos, permeiam essa pauta.

O problema é que os preços em queda dos seis últimos meses descompensaram demasiadamente os seis primeiros. Logo, o produtor entra mais descapitalizado daqui para frente e com custos de produção que não mostram flexibilidade extra, apesar de boas safras de soja e milho (safrinha, de inverno). Portanto, a melhor relação de troca ainda não está no horizonte, embora possa haver ganhos na reposição com a baixa do bezerro.

Até por volta da penúltima semana de dezembro o boi gordo caiu 15,75% deflacionado pelo IGP-DI, no acumulado de 2022. No atacado, o cálculo do analista do Cepea e professor da Unesp foi de menos 11,25% na carcaça casada (quartos traseiros, dianteiros mais ponta de agulha).

Exportações

A questão das exportações vai adicionar pressão porque o ganho de demanda aguardado até dezembro pode não superar 3%. Não será, se confirmado, um dado de todo ruim, argumentar Hyberville Neto, mas combinado com os fatores descritos vai deixar os frigoríficos fazendo pressão.

Em 2022, as vendas externas bateram recordes. Os números totais, entre carne fresca e processada, devem sair nos próximos dias, mas serão recordes. Só em produto in natura, praticamente ficou igual a tudo que se exportou em 2020, pouco mais de 2 milhões de toneladas, com US$ 11,7 bilhões.

Sobre 2021 (1,560 milhão/t, entre in natura e processada) não haveria dúvidas que os números seriam bem superiores, uma vez que a China ficou o último trimestre fora das compras.

Mas o CEO da HN Agro atenção para dois aspectos, que podem atenuar a pouco esperança depositada na China após o país voltar às importações assim que passar o Ano Novo Lunar (entre fim de janeiro e começo de fevereiro). Vale dizer que o principal destino da carne brasileira já vinha renegociando preços para baixo e está às voltas com a situação da covid, além de transferir para 2023 a desaceleração do crescimento de 2022.

Hyberville Neto deposita expectativa, certamente como os grandes frigoríficos, de que Coreia do Sul e Japão possam liberar as importações do produto brasileiro. “São grandes compradores e, juntos, representam mais ou menos a metade do que a China compra”, diz.

Uma nova habilitação de planta para os Estados Unidos, hoje o segundo destino, também está no radar. Se confirmada, possivelmente seria da Frigol, o quarto grupo exportador brasileiro e que está em fase avançada nas negociações com os americanos.

Essas duas janelas ficariam mais fortes em 2024, mas deixariam já em 2023 o mercado mais vendido.

 

Repórter no Agro Times
Jornalista de muitas redações nacionais e internacionais, sempre em economia, após um improvável debut em ‘cultura e variedades’, no final dos anos de 1970, está estacionado no agronegócio há certo tempo e, no Money Times, desde 2019.
Jornalista de muitas redações nacionais e internacionais, sempre em economia, após um improvável debut em ‘cultura e variedades’, no final dos anos de 1970, está estacionado no agronegócio há certo tempo e, no Money Times, desde 2019.
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