Coluna do Estevão Seccatto

‘Caixa é Rei’: O que é e como isso é usado em restruturação empresarial

13 dez 2023, 12:30 - atualizado em 13 dez 2023, 12:30
caixa empresa liderança
Gerenciamento: Em uma empresa estressada financeiramente isso significa priorizar o caixa, acima de tudo. (Imagem: Reuters/Bruno Domingos)

Um dos principais fatores diferenciadores de uma empresa em crise é a pressão de caixa que recai sobre a administração. Tal qual um navio, a empresa precisa se adequar aos mares por onde navega.

Em uma empresa estressada financeiramente isso significa priorizar o caixa, acima de tudo. “Cash is King”, o Caixa é Rei, como amplamente mencionado por quem pratica restruturação empresarial.

Em momentos de crise, a priorização de caixa precisa ser abrangente. A empresa precisa buscar fornecedores com prazos de pagamento maiores e clientes que paguem mais rápido, mesmo que isso signifique (até certo ponto) sacrifício das margens.

E mais: a necessidade dessa mudança precisa chegar a todas as áreas da organização. Quanto mais rápido a empresa se colocar em modo de restruturação, abandonando práticas antigas e quebrando o ciclo vicioso (que provavelmente fizeram com que ela entrasse em colapso), mais rápida será sua recuperação. A velocidade da mudança de rumo fará diferença entre o fracasso e o sucesso.

Caixa é Rei: Erros mais comuns

Um dos principais erros cometidos é a insistência em olhar somente o demonstrativo de resultados (DRE) contábil (ou mesmo o gerencial).

Se você é gerente de compras, avaliado somente pelo resultado contábil, chances são de um fornecedor lhe oferecer o seguinte acordo: compra de lote de matérias-primas muito maior do que a empresa precisa, com desconto no preço.

Se você aceitar, estará utilizando a liquidez da empresa (caixa) no estoque, mas, como custo financeiro desta operação não aparece no resultado da sua área, os seus incentivos irão te levar a aceitar a oferta, por mais que a decisão mais correta fosse recusá-la. Este racional vale para todas as áreas.

Outro grande erro que percebo é a cultura de remunerar a área comercial somente por crescimento de receita, sem levar em consideração os prazos médios de recebimento.

Por mais paradoxal que possa parecer, empresas que estão crescendo também quebram por descompassos de capital de giro. Para avançar no processo de turnaround corporativo, diversas mudanças são necessárias e, para que sejam bem-sucedidas, não só a comunicação como também a execução é fundamental. A capacidade de mudança é transformar o discurso em ação.

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A liderança é fundamental para a restruturação empresarial

O exemplo precisa vir da liderança com os sinais claros e objetivos inconfundíveis. Os interesses precisam estar alinhados, todos na mesma direção.

Para isso os executivos precisam ser faróis das mudanças, e se adequarem àquilo que a empresa precisa para aquele momento. Nesse sentido, um movimento extremamente efetivo é incluir metas de caixa nos incentivos de executivos.

Um caso pratico que menciono é de um cliente que, antes do processo de mudança dessa mentalidade, tinha as metas dos principais executivos e todo o cálculo de remuneração do time comercial atrelado somente às vendas, desconsiderando completamente o caixa.

Os vendedores recebiam a totalidade de suas comissões imediatamente após a emissão do pedido, completamente descasadas com as entradas de caixa de suas vendas. Com isso, o único objetivo era fechar vendas maiores, independente do prazo de recebimento e rentabilidade, gerando uma grande quantidade de pedidos com prazos muito mais alongados do que o suportado pelo caixa.

A empresa demorava para receber, ou então tinha que recorrer a operações financeiras muito longas (e custosas) de descontos de duplicatas. Em um cenário onde as margens já estavam super apertadas, essa era a receita certa para a crise.

A solução passou pelo redesenho dos incentivos e bonificações, com incorporação do custo de captação de recursos financeiros para dentro da modelagem dessas metas, em que quem vendesse com prazos mais curtos seria beneficiado.

A comissão passou a ser paga sobre o valor presente da venda, com aumento nas comissões pagas, incentivando vendas com prazos curtos de recebimento, produtos com grande estoque (girar mais) ou com melhor margem. Esses ajustes foram feitos na área comercial, e estendido aos executivos de todas as áreas.

Com isso conseguiu-se mudar comportamentos, diminuir barreiras e aumentar interações entre as áreas, abordando toda a cadeia de valor:

  • a produção passou a ser incentivada a ser eficiente em termos de custos e otimizar os estoques;
  • a área de compras passou a se motivar não só pelo melhor preço, com as melhores condições de pagamento, mas também levar em consideração os custos financeiros e logísticos associados à manutenção de níveis de estoque maiores do que os necessários;
  • a área de finanças assumiu protagonismo maior, saindo da função de tomar conta do dinheiro e passando a ser desafiada a estudar maneiras de contribuir para o aumento do caixa.

Por mais que os resultados alcançados possam ser positivos, toda mudança tem seus percalços. Se os benefícios são tão óbvios, todas as empresas deveriam conseguir executar com sucesso esse movimento.

Como sei que isso não é verdade, alerto para os principais opositores dessa mudança: a falta de consistência entre mensagem e as atitudes da liderança, e resistência à mudança, que deve ser eliminada com mãos de ferro, o quanto antes.

Estevão é conselheiro e gestor de empresas, tendo assessorado mais de 110 empresas em diversos setores. Professor de Turnaround na FIA Business School e Empíricus Research. Colunista do Money Times, entre outros. Engenheiro naval (Poli/USP), extensão em economia (Harvard), finanças e marketing (USP), tecnologia (Singularty University), finanças descentralizadas (Duke University), mestrando stricto sensu em gestão (University of Liverpool) e MBA em Banking (FIA). Foi head global de M&A da Atento (NYSE), reestruturador de empresas pela KPMG e IVIX, diretor da G4S (LSE) e associado da Artesia private equity (investimento e IPO de 3 empresas).
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Estevão é conselheiro e gestor de empresas, tendo assessorado mais de 110 empresas em diversos setores. Professor de Turnaround na FIA Business School e Empíricus Research. Colunista do Money Times, entre outros. Engenheiro naval (Poli/USP), extensão em economia (Harvard), finanças e marketing (USP), tecnologia (Singularty University), finanças descentralizadas (Duke University), mestrando stricto sensu em gestão (University of Liverpool) e MBA em Banking (FIA). Foi head global de M&A da Atento (NYSE), reestruturador de empresas pela KPMG e IVIX, diretor da G4S (LSE) e associado da Artesia private equity (investimento e IPO de 3 empresas).
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