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Marcelo Miranda: o blockchain como evolução natural dos meios de pagamento

17 maio 2020, 13:00 - atualizado em 17 maio 2020, 11:10
Qual o caminho a percorrermos até termos o blockchain intrínseco em nosso dia a dia financeiro? (Imagem: Freepik/vectorpouch)

Em 2008, quando Satoshi Nakamoto publicou seu whitepaper com o título “Bitcoin: A Peer-to-Peer Electronic Cash System“, deixou bem claro seu objetivo logo nos primeiros parágrafos: eliminar o que chamou de “trust spreads”.

De acordo com Satoshi, a possibilidade de reversão (estorno) de transações e pagamentos on-line gera um custo de mediação e fraude para os intermediários, como bancos e empresas de cartões.

Com a
possibilidade de reversão, a necessidade de confiança se espalha.

Satoshi Nakamoto

Apesar do objetivo bem claro do misterioso criador do bitcoin e do inegável sucesso de seu protocolo, as coisas no universo das criptomoedas evoluíram de maneira bem diferente do que alguém poderia imaginar ao ler (ou escrever) o whitepaper em 2008.

Hoje em dia, quando se fala em criptomoedas, as primeiras coisas que vêm à cabeça são investimento, “trade” ou reserva de valor.

Quanto ao uso de bitcoin para o e-commerce, como proposto por Satoshi, podemos dizer que o uso ainda é tímido após mais de dez anos de existência, com alguns casos de sucesso muito específicos como pagamentos “cross-border” (internacionais).

Só para se ter uma noção do quanto é pequeno o uso de criptomoedas para pagamentos, a Bitpay, uma das principais empresas desse segmento, reportou um volume de transações recorde de US$ 1 bilhão em 2018. As exchanges no mundo negociam cerca de 40 vezes esse valor por dia, somente em bitcoin.

Existem várias razões para essa falta de tração do bitcoin para pagamentos. A principal delas é a expectativa de valorização da moeda.

BitPay é uma das plataformas mais populares no setor de pagamentos em criptoativos, com grandes volumes de negociação (Imagem: Crypto Times)

Quem possui bitcoin tem, naturalmente, uma visão de que ela pode, em algum momento, se valorizar; usá-la agora para pagar alguma coisa seria, inevitavelmente, ir contra essa visão.

Outra razão é quantidade muito limitada de estabelecimentos que aceitam criptomoedas. Algumas alternativas para contornar esse problema foram criadas, como cartões de débito das bandeiras Visa ou Master, que são pré-pagos em cripto.

Por mais que seja uma solução criativa, a adoção foi, no máximo, moderada e, com certeza, algo bem longe da visão original de Satoshi Nakamoto, só trocando parcialmente os intermediários e com o mesmo problema de “trust spreads”.

Do lado dos sites de e-commerce, receber em cripto nem sempre é algo trivial e o comerciante tem que tomar a decisão de contratar um intermediário como Bitpay (leia-se “pagar taxas”) ou tentar receber diretamente e ter que administrar a volatilidade das criptomoedas, que pode chegar facilmente a 10% ao dia.

Se por um lado os pagamentos em bitcoin não evoluíram tanto, por outro, a chegada das stablecoins promete mudar totalmente esse placar.

As “stablecoins” ou “stabletokens” são criptomoedas que trafegam em blockchain, assim como bitcoin ou ether, mas possuem um lastro em moeda fiduciária, como dólar, euro ou real.

Moedas Câmbio Dólar Euro Libra
Stablecoins são criptomoedas de valor fixado a uma moeda nacional ou fiduciária, como o euro, o dólar, o iene, o yuan (Imagem: Reuters/Jason Lee)

A Libra, proposta pelo Facebook, seria uma “stable” com lastro em uma cesta de moedas fiduciárias, por exemplo.

Criados inicialmente por quem mais entende do assunto, ou seja, as exchanges, os stabletokens tiveram uma ascensão meteórica e, se somados, já seriam a terceira maior criptomoeda em capitalização de mercado, com cerca de US$ 10 bilhões, atrás apenas de bitcoin e ether.

Em volume de transações, stables já disputam de igual para igual a dominância.

Por terem lastro centralizado em algum intermediário, stables também não se enquadram perfeitamente na visão “trustless” de Satoshi.

Porém, se acreditamos que o blockchain pode ser uma forma mais barata e com mais transparência que os meios tradicionais de pagamento, podemos considerar que estamos no caminho certo. Além disso, a irreversibilidade de transações, tão desejada por Nakamoto, é uma característica natural das stablecoins.

Agora, sua evolução vai passar por algumas bifurcações. De um lado, já temos os bancos centrais de diversos países, como a China, explorando stablecoins em forma de CBDC (sigla em inglês para “moeda digital de banco central”) com o intuito de acelerar a transição para uma sociedade “cashless“.

No outro extremo, temos empresas como Facebook, com iniciativas para a criação de uma stablecoin privada.

Também temos fintechs utilizando stablecoins baseadas em blockchains públicos, como a Ethereum, para aumentar a transparência e agilidade em pagamentos, como o app PandaPay, no Brasil, e Celo, nos Estados Unidos.

Todas essas vertentes devem crescer nos próximos anos e, por mais que sejam ideias aparentemente concorrentes, possuem o objetivo comum de trazer alternativas para os meios de pagamentos tradicionais.

Quem sabe, em um futuro não muito distante, poderemos cada vez mais nos aproximar da visão “trustless” de Satoshi Nakamoto.

Marcelo Miranda foi um dos pioneiros do blockchain no Brasil. Fundou a FlowBTC em 2015, primeira exchange brasileira a ter um sócio do mercado financeiro, o Banco Plural. Foi Diretor de Equity Trading no Deutsche Bank em São Paulo e Nova York. É formado em Economia pela UFRJ, tem MBA pela Universidade de Michigan e é Gestor CGA Anbima.

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Fundador da FlowBTC
Um dos pioneiros do blockchain no Brasil. Fundou a FlowBTC em 2015, primeira exchange brasileira a ter um sócio do mercado financeiro, o Banco Plural. Foi Diretor de Equity Trading no Deutsche Bank em São Paulo e Nova York. É formado em Economia pela UFRJ, tem MBA pela Universidade de Michigan e é Gestor CGA Anbima.
marcelo.miranda@moneytimes.com.br
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Um dos pioneiros do blockchain no Brasil. Fundou a FlowBTC em 2015, primeira exchange brasileira a ter um sócio do mercado financeiro, o Banco Plural. Foi Diretor de Equity Trading no Deutsche Bank em São Paulo e Nova York. É formado em Economia pela UFRJ, tem MBA pela Universidade de Michigan e é Gestor CGA Anbima.
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